Henrique Vieira Filho
Henrique Vieira Filho

Henrique Vieira Filho é jornalista, escritor, terapeuta, sociólogo, artista plástico, agente cultural, diretor de arte, produtor audiovisual, educador físico, professor de artes visuais, pós-graduado em psicanálise e perícia técnica de obras de arte.

Colunas

Que Presepada!

Neste artigo para o Jornal O SERRANO, Henrique Vieira Filho relata a tradição do presépio, desde a criação por Francisco de Assis, até as versões modernas e populares, muitas vezes, de qualidade duvidosa, a tal ponto que deu origem à expressão “presepada”. Publicado resumido no Jornal O SERRANO, Nº 6333, de 02/12/2022

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Que Presepada!
Arte: Multidão (referenciada no presépio do Museu de Arte Sacra – Artista: Henrique Vieira Filho

Em 1223, São Francisco de Assis, para tornar lúdico o ensino da história de Cristo, modelou com argila, em tamanho natural, os principais personagens participantes do nascimento de Jesus, recriando a cena em uma gruta, que contou até com um boi e um burro vivos, para maior realismo.

Gradativamente, as igrejas adotaram a ideia e somente no Século 15 a nobreza introduziu em seus lares, na forma de luxuosos objetos de decoração. Demorou mais algumas centenas de anos para que versões mais acessíveis fossem fabricadas e pudessem ser adquiridas pelas famílias mais modestas, conquistando a popularidade atual.

Do latim “praesepium” – que significa o mesmo que “estábulo = lugar para se estar”, a palavra “presépio”, antes designando “estalagem”, “hospedaria”, “curral”, ganhou conotação religiosa, tornando-se sinônimo de cenas natalinas.

Além das estatuetas representativas, feitas dos mais variados materiais e em diversos tamanhos, foi e ainda é popular a versão com atores incorporando Maria, José, pastores e magos. Muitas das vezes, contando com elenco amador, além de cenografia e figurinos improvisados, o resultado final deixa a desejar, a tal ponto de dar origem ao brasileirismo “presepada”, que é sinônimo de “espetáculo ridículo”.

O extremo oposto do adjetivo acima se encontra no Museu de Arte Sacra de São Paulo, onde mais de 1600 peças compõem, além do autos de Natal, toda uma vila napolitana do século 17, com centenas de personagens em seus ofícios, casas, móveis, ferramentas, paisagens, ocupando cerca de 110m² de cenas extremamente detalhadas.

Tão impressionado fiquei que fiz questão de retratar algumas destas poses em minhas pinturas, transpondo-as como se fossem um vilarejo chinês da antiguidade.

Contudo, é de minha infância, estando em Serra Negra, que a memória de um presépio mais me encanta: na praça principal, montada sobre uma bancada, além dos indispensáveis personagens sacros, outros tantos bonecos dividiam o palco, com movimentos e coreografias gerados por uma infinidade de engrenagens e cabos de arames interligados a um motor elétrico (sim, claro que espionei por debaixo da mesa, levantando a toalha).

Acuda-me, Nestor Leme, que é a memória vida da cidade: isso realmente acontecia ou foi um sonho de Natal?

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