Nestor Leme
Nestor Leme

Nestor Leme é um historiador dedicado à preservação da história de Serra Negra. Além de ser o proprietário de um valioso acervo online, repleto de informações e fotografias históricas da cidade, ele também desempenha um papel crucial como colaborador no livro 'Capelas Rurais de Serra Negra – História e Fé'.

Colunas

O Tatu Fogueteiro

Nestor narra a história de Jesus Adib Abi Chedid, um influente político em Serra Negra, conhecido pelo apelido "Tatu Fogueteiro" devido ao uso constante de fogos de artifício para celebrar suas realizações e inaugurações durante sua administração. A narrativa descreve suas ações como prefeito e o impacto duradouro de seu legado político na cidade.

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O Tatu Fogueteiro
Antigo registro do Centro de Convenções, ainda em obras | Nestor Leme

Numa manhã dos anos sessenta, eu, à caminho do trabalho, avistei um desconhecido saindo de uma casa no início da Rua Coronel, e ele também estava à caminho do serviço, pois usava um macacão de mecânico, e quando passamos um pelo outro, nos cumprimentamos com um bom dia. Isso se repetiu nos dias seguintes, pois saíamos para o trabalho no mesmo horário. Logo, soube que ele estava em Serra Negra  para dirigir o Rápido Serrano, pois sua família tinha comprado aquela empresa de transportes e que seu nome era Jesus.

Meses após nosso primeiro encontro, estava numa reunião de políticos e lá, percebi que Jesus gostava mesmo era de política, pois ele presidia aquela reunião. E algum tempo depois, soube que ele tinha sido eleito presidente do Serra Negra Esporte Clube, lugar onde começou a história do título acima. Foi lá, que o homem mostrou que tinha chegado para mudar as coisas. O salão de festas do clube, construído no início dos anos sessenta, era baixo, e Jesus logo ordenou uma obra para levantarem o telhado e construírem um mezanino, obra que proporcionou o aumento de frequentadores nas festas ali realizadas, e que teve sua inauguração saudada com uma grande bateria de foguetes. Naquele dia, descobriram que Jesus também gostava de barulho.

Em 1973, o prefeito Ângelo Zanini faleceu e soubemos que Jesus Adib Abi Chedid tinha sido nomeado pelo governador Laudo Natel para ser o nosso prefeito. Bem, Jesus tomou posse e mais rojões foram soltos para recebê-lo na prefeitura. Daí em diante, não houve uma só semana ou dia que o nosso povo não ouvisse rojões espocando pelos quatro cantos da cidade. Nascia ali a história do Tatu Fogueteiro, apelido que os corneteiros lhe deram. Diziam que, a cada buraco que ele abria, era inaugurado com uma bateria de foguetes. E dizia-se também que ele devia ser sócio da “Caramuru”, conhecida marca de fogos de artíficio.  E ele logo mostrou que era bom administrador, pois são visíveis as mudanças que aconteceram em Serra Negra durante sua administração.

Algum tempo depois de sua posse, ele encerrou a concessão do uso do Balneário Municipal por terceiros, e ali, instalou a sede de seu governo – tudo isto, é claro, com espocar de muitos foguetes.

Daí em diante, a cidade virou um canteiro de obras. Primeiro, as ruas que eram de paralelepípedos receberam coberturas de asfalto, todas inauguradas com discursos e grande queima de foguetes. Abertura da Av. Laudo Natel, mais foguetes, cobertura do ribeirão, inauguração da Praça Sesqui e outras obras, tudo saudado com baterias de rojões. Eram tantos os foguetes espocando nos céus serranos, que não sabíamos se eram para festas religiosas, vitórias no futebol, se alguém tinha ganhado no jogo do bicho, ou se era mesmo o Tatu Fogueteiro.

Teve um tempo que a coisa esquentou, pois o casario serrano tremeu com as explosões das pedreiras para a abertura da saída para Lindóia, e de outra, para construção do Centro de Convenções. Um dia, o tempo dele acabou, mas sua marca ficou na política de Serra Negra. Hoje, mais de cinquenta anos depois de sua passagem por nossa prefeitura, todos os prefeitos eleitos depois dele, saíram de seu grupo político. Até aquele que lhe fazia oposição, teve que se aliar a ele para chegar a prefeito. Tudo isto, com o espocar de centenas de foguetes pelos céus serranos.

Bem, o Jesus levou a culpa do foguetório, mas na verdade, os foguetes tiveram seus estopins acesos, pelo personagem Bolinha, este sim, o chefe dos fogueteiros...

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